Evacuar é uma tarefa árdua para a maioria das portadoras de endometriose. Eu lembro-me bem da época em que sofria muito para ir ao banheiro. Juro que uma das piores sensações da vida era as inúmeras e quase sempre vezes que saia do banheiro com a evacuação incompleta.
Sem contar que diarreias eram frequentes em praticamente todos os meus períodos menstruais desde minha menarca aos 13 anos. Por isso sempre achei que fosse ‘normal’ evacuar diarreia durante a menstruação.
Escrevi sobre isso em 2011 no blogspot – já estou reescrevendo para postar em breve, agora com minha nova versão de evacuação completa mas passei a maior parte da minha vida evacuando de forma errada, desde a forma como ‘sentar’ e até mesmo o ‘segurar’ as fezes quando não tinha local próximo ou não me sentia confortável.
Outra questão que também sempre achei estranho era quanto ao formato das fezes. E eu nunca tinha escutado nada a respeito até 2010, quando iniciei a fisioterapia e respondi um questionário sobre fezes.
Você sabia que tanto a constipação quanto a diarreia são diferenciadas pelo formato das fezes? Você sabia que a incoordenação muscular do assoalho pélvico da mulher pode provocar constipação? E que a forma correta de sentar para evacuar não é a que tradicionalmente fazemos?
Para falar mais sobre o assunto convidei à fisioterapeuta Ana Paula Bispo, doutora em Uroginecologia pela Unifesp, para explicar mais sobre a constipação intestinal, que pode se tornar crônica, e os formatos e os tipos de fezes.
A fisioterapeuta também dá dicas de como evitar a constipação intestinal e explica a posição correta para evacuar. Outro texto que foi sucesso no blogspot, com mais de 25 mil acessos, e que vai estrear uma sequência de textos que farei sobre o assunto. Beijo carinhoso! Caroline Salazar
Leia também: Constipação, diarreia… Como são as fezes de quem tem endometriose?
Constipação intestinal, formato das fezes e a forma correta para evacuar!
Por doutora Ana Paula Bispo
Edição: Caroline Salazar
A constipação intestinal crônica é definida como a presença de duas – das seguintes queixas – em no mínimo 25% das evacuações e, por pelo menos, 12 semanas nos últimos 12 meses:
- Esforço aumentado;
- Fezes em cíbalos (bolinhas) ou endurecidas;
- Sensação de esvaziamento incompleto (sensação de que ainda ficou fezes no reto);
- Sensação de obstrução ou bloqueio anorretal;
- Manobras digitais (com o auxílio das mãos) para facilitar a saída das fezes;
- Menos que três evacuações por semana.
A constipação intestinal pode ser ocasionada por uma disfunção dos cólons ou de estruturas de região anorretal, retardo do trânsito no intestino grosso ocasionado por um distúrbio motor primário associado a várias doenças ou uso de alguns medicamentos, ou por transtorno da evacuação.
No transtorno da evacuação, a eliminação do conteúdo do intestino é inibida em consequência da hipertonia (tensão) do canal anal ou da incoordenação entre os músculos do assoalho pélvico e o músculo esfíncter anal interno (músculo do ânus de contração e relaxamento involuntário).
Quando a permanência é muito prolongada do conteúdo intestinal na luz do reto, leva ao endurecimento das fezes e a dilatação do reto, que é também um transtorno da evacuação.
As pessoas que tem constipação intestinal possuem um formato de fezes diferentes daquelas que o intestino funciona corretamente. Uma escala médica foi desenvolvida para classificar os tipos de fezes, chamada de Escala de Bristol. Fezes no formato tipo 1 e tipo 2 são características de constipação intestinal.
Num estudo realizado em 2007 com mulheres com endometriose com comprometimento do trato gastrointestinal (TGI), foi constatado que 27,5% delas tinham constipação intestinal dentre outras queixas gastrointestinais.
Como evitar a constipação intestinal?
Não adiar a evacuação:
Uma das principais funções do intestino é a absorção de água e sais minerais. A água que existe no bolo alimentar vai sendo absorvida ao transitar pelo intestino, transformando esse bolo alimentar em fezes.
Quando se evita evacuar (ou seja, “segurar”), as fezes ficam dentro do intestino por mais tempo do que deveria, ressecando mais do que o normal, dificultando a saída e mantendo as fezes por mais tempo na ampola retal (a porção final do reto que serve de depósito final para as fezes que serão evacuadas), tornando ainda mais difícil o ato evacuatório.
Portanto, reprimir o desejo de evacuar durante viagens ou quando se está fora de casa, acaba sendo uma das maiores causas de constipação, especialmente entre as mulheres que, por vergonha, acabam desregulando o funcionamento intestinal natural.
Dieta adequada:
É necessária uma mudança nos hábitos alimentares de uma maneira global, inclusive, na ingestão de água. É fundamental e muito importante um acompanhamento com um nutricionista.
Evitar problemas que causam dor local:
Qualquer coisa que cause dor ou desconforto na região anal, como fissuras anais e hemorroidas, vão fazer com que a mulher tente evacuar o mínimo de vezes possível.
E as fezes ficando mais tempo no intestino, vão ressacar mais, dificultando ainda mais a sua saída, causando mais dor e iniciando um ciclo vicioso onde evacuar torna-se cada vez mais doloroso e complicado.
Tratar a Incoordenação dos músculos do assoalho pélvico (MAP):
É comum encontrar mulheres cuja causa da constipação seja a incoordenação muscular, ou seja, para evacuar, elas relaxam os esfíncteres anais, mas contraem os MAP (músculos do assoalho pélvico) dificultando ou até impossibilitando a evacuação.
Esse não relaxamento dos MAP, em especial, o músculo puborretal, é chamado de anismo. Conhecer e aprender a contrair e relaxar de maneira apropriada o músculo geralmente é suficiente para resolver o problema.
Posição correta para evacuar:
Nós nascemos para defecar agachados. Os seres humanos fizeram isso por muitos milênios até a chegada dos banheiros modernos.
Quando você está sentada formando um ângulo de 90 graus entre o tronco e o quadril, o seu reto, que é por onde as fezes passam, fica “dobrado” porque o músculo puborretal não relaxa completamente.
Quando você está agachada ou com um apoio nos pés, a angulação diminui, permitindo o relaxamento completo do puborretal e o esvaziamento completo do reto.
Portanto, quando for evacuar, sente com um apoio nos pés, tire a calcinha pelo menos de um dos pés (não pode ficar apoiada nos joelhos nem nos tornozelos), afaste levemente as pernas e incline o tronco levemente para frente, o suficiente para que os cotovelos possam ficar apoiados sobre os joelhos.
Procurar formas alternativas de proteção para evacuação é importante para quando o desejo evacuatório surgir fora de casa, como por exemplo, forros descartáveis para cobrir o assento do vaso sanitário.
A fisioterapia pélvica dispõe de vários recursos que podem auxiliar no tratamento da constipação intestinal crônica, são eles: biofeedback manométrico ou eletromiográfico, que trata a incoordenação dos músculos do assoalho pélvico, balonete retal para treino evacuatório e massagem abdominal no sentido do trânsito colônico.
Sobre a fisioterapeuta Ana Paula Bispo:
Ana Paula Bispo é fisioterapeuta, doutora em Urologia na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e mestre em Ginecologia pela Unifesp, mesma instituição que fez especialização em Reabilitação do Assoalho Pélvico. Siga a fanpage da doutora Ana Paula Bispo.
Imagem: Deposit Photos/ Caroline Salazar