Gerar um filho, antes de tudo, é desejá-lo dentro do nosso coração. Afinal é de lá que vem todo amor que damos ao próximo e, para o nosso filho, não poderia ser diferente.
Porém quando as endomulheres se descobrem inférteis muitas veem seu mundo desabar. Ser mãe é muito mais que gerar um filho. Sei que muitas mulheres têm esse sonho, mas dá sim para ser mãe de outras formas, e a adoção é uma delas. Infelizmente ainda há muito preconceito quando falamos em adoção.
Adoção tardia, então, nem se fala. E quando a criança tem alguma deficiência, é ainda mais difícil encontrar um lar. Precisamos falar mais de adoção e, especialmente, de adoção tardia. A ideia da coluna “Gestação do Coração” surgiu para incentivar a adoção entre as endomulheres que se descobriram inférteis, mas que nutrem no seu coração o desejo de ser mãe.
Há três anos Ane começou a compartilhar sua história em busca da tão sonhada maternidade. Lembro-me de cada passo, a expectativa de antes de tudo começar, a entrada para o Cadastro Nacional de Adoção, ansiedade para as entrevistas e de quando meu telefone tocou e era Ane dizendo: “Estou em trabalho de parto, meu filho está nascendo”.
Só de lembrar me emociono.
Ane e Paulo queriam ser pais e há pouco mais de um ano eles conseguiram realizar o sonho de formar sua família. E é sobre as descobertas e as aventuras deste primeiro ano de maternidade o texto de Ane. Um texto de grandes emoções. Beijo carinhoso! Caroline Salazar
Meu primeiro ano como mamãe de Danilo
Por Ane Bulcão
Edição: Caroline Salazar
Olá meninas, hoje quero compartilhar com vocês um pouquinho da maravilhosa experiência de ser mãe. No último dia 29 de agosto fez um ano que nosso príncipe chegou para completar nossa felicidade, e devo dizer que este foi um tempo de intensas mudanças e adaptações à nova vida.
Vou tentar resumir e pautar os eventos mais significativos que vivenciamos nestes últimos 365 dias como pais marinheiros de primeira viagem.
Para começo de conversa, desde o princípio quando nos colocamos num perfil amplo de adoção tardia, sabíamos que não seria fácil, que a adaptação exigiria de nossa parte muita paciência, perseverança e, sobretudo, muito amor. Afinal de contas estava chegando para nós um diamante em estado bruto que precisaria ser lapidado com muito cuidado para que não se despedaçasse.
Isso é muito importante ressaltar porque durante esse período ouvimos de várias pessoas expressões do tipo: “Nossa, seu filho tem que levantar as mãos para o céu e ser eternamente grato a Deus por vocês o terem tirado do abrigo”. Como se nós estivéssemos em posição superior e nosso filho mera parte submissa nesse processo.
Porém as coisas não são assim dessa forma que o senso comum pensa ser.
Nessa relação há uma criança que foi muito maltratada pelas circunstancias da vida, que não experimentou o verdadeiro amor de uma família, e um casal que estava aprendendo a serem pais – na prática e no cotidiano -, buscando apoio de literatura específica sobre o tema, conselhos dos veteranos na arte de educar os filhos e, sobretudo, buscando inspiração e orientação divina, de forma que quando eu e meu esposo entramos nessa de cabeça, mergulhamos fundo nessa experiência cônscia de que muitas surpresas estariam por vir.
Além do mais filho é filho. Muitas vezes eles nos machucam com algumas atitudes, mas nem por isso deixamos de amá-los.
E passado a euforia e o oba-oba pela mudança de cidade e de casa, começaram vir os testes e não demorou muito para que Danilo se mostrasse como realmente era: insubordinado, não gostava de cumprir regras e obedecer e, muitas vezes, agressivo, ao passo que era uma criança doce e meiga, mas com muita facilidade se transformava quando sua vontade não era feita.
Ficamos preocupados sim, mas muito mais tomados de compaixão por ver em seus olhinhos que por trás de toda aquela rebeldia estava o medo de ser abandonado novamente. Por isso era muito mais fácil não se permitir vivenciar o amor e o aconchego de uma família.
Eu e Paulo seguimos firmes em nosso propósito de lhe ensinar o amor. O amor sacrificial tal qual nosso Deus e Pai derramou por nós. Foi muito emocionante quando Danilo percebeu que não precisava ficar na defensiva, nem resistir por que o amor tudo espera e tudo suporta.
Aos poucos nosso menino foi se despindo de toda reserva e se entregando com um brilho no olhar de quem estava gostando de tudo aquilo e finalmente podia descansar porque agora ele tinha e tem quem cuide dele.
E por falar em cuidado me lembro do dia que estava no trabalho e Paulo me enviou uma foto de Danilo com o pé quebrado. Ele estava brincando de bola na escola e se machucou. Isso aconteceu no final de junho. Eu quase tive um troço.
Acho que na hora minha pressão subiu e não consegui fazer mais nada direito, foi um grande susto, mas enfim lá fomos nós ao hospital para imobilizar o pé da criança que não para quieta um minuto.
Detalhe: a gente estava prestes a entrar de férias e iríamos realizar seu sonho de “viajar de mala e de avião” (risos). Ele ficou com medo de não tirar o gesso a tempo, mas no final deu tudo certo.
Danilo ficou cercado de todo amor e cuidado tanto por mim quanto pelo papai que ele tanto ama. E nesta época ele começou a medir nosso amor.
Vire e mexe perguntava: “Se acontecer outra coisa pior comigo vocês choram?” “Se eu morrer, você e o papai choram?” Ele perguntava só para ver nossa resposta: “Claro filho porque amamos você”. E seu sorriso se abria de orelha a orelha. Ele vinha nos abraçava e nos enchia de beijo dizendo que também nos ama.
Passados um mês e meio do incidente na escola, novamente ele esse machucou. Desta vez, ele estava conversando com os amiguinhos e, ao sinalizar de forma muito enfática, teve uma contusão no dedo.
Mais uma vez lá vamos nós ao hospital. Teve que imobilizar e colocar uma tipoia por 15 dias. Percebi que nesses dias ele ficou bem mais dengoso e queria total atenção, pois para ele era muito importante que nos preocupássemos e desse todo amor. Afinal amor é uma coisa que Danilo nunca havia experimentado.
Li certa vez numa rede social que ser mãe de menino é sofrer um mini-infarto todo dia e ainda estar feliz por ver seu filho se desenvolvendo e acumulando histórias para contar quando crescer. E é bem isso mesmo que estamos vivendo e tem sido maravilhoso.
Há alguns dias Danilo me surpreendeu. Ao olhar as fotos dos nossos primeiros dias quando ele chegou e que me agredia, ele falou: “Mamãe nessa foto eu ainda estava bruto com você né?” Eu respondi que sim, mas que agora ele tinha nova vida e que esse assunto era passado e não precisava fica lembrando.
Aí ele emendou: “Não mamãe, eu estava errado. Não pode bater na mamãe e nem ser bruto. Tem é de fazer muito carinho porque Papai do Céu fica triste. Jesus é nosso amigo e a gente tem de mostrar amor e não raiva. Eu te amo”.
Com tamanha demonstração de amor e superação não tenho nem palavras para descrever tamanha alegria que invade minha alma. Cada um oferece o que tem, e no caso de nosso filho ele viu e viveu muitas experiências traumáticas, não teve amor e apoio familiar que lhe garantisse segurança e conforto.
Não foi fácil para ele e muito menos para nós. E quando eu e meu esposo falamos que acreditamos que o ser humano é passível de mudança, e que está sempre se transformando não falamos da boca para fora.
A mudança na vida do meu filho, Danilo, é notável e na nossa também. Sou imensamente grata ao Senhor por me presentear com uma família linda, que é muito mais do que eu poderia imaginar.
Tenho um esposo maravilhoso que me ama e mima muito, e agora para completar chegou meu príncipe, um filho mais que especial que veio para me ajudar a ser uma pessoa melhor neste mundo.
Esse foi o resumo do nosso primeiro ano. E estamos apenas no começo de nossa história. Muitos outros anos ao lado de Danilo virão e espero daqui um ano contar novas surpresas, descobertas e ainda sei que vou me surpreender muito com nosso amado filho. Um beijo carinhoso e até a próxima.