David Redwine: Os problemas com a teoria de Sampson – É uma teoria ou uma desculpa?

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Após a primeira parte da série “Desvendando Samspon”, onde o doutor David Redwine explicou quem foi John Sampson e qual sua teoria para endometriose, o cientista americano esclarece os problemas da teoria da menstruação retrógrada.

Com quase 100 anos de existência – a serem completados em 1927 – a teoria que fala do refluxo menstrual nunca foi comprovada pela ciência.

Nenhuma pesquisa nunca conseguiu comprovar que as células da endometriose são capazes de se implantar em outros tecidos, por exemplo.

Se a medicina é uma ciência, então deve ser baseada em evidências, em provas científicas, certo? E é justamente isso que estamos vendo e vivendo nesse tempo da pior pandemia do século.

O tema vale um texto no blog, mas se para o novo coronavírus a ciência precisa ser validada – que está certíssimo – por que para a endometriose não?

Acreditar que a endometriose vem da menstruação retrógrada, mesmo sem nenhuma evidência científica até hoje, faz o cirurgião repetir o mesmo erro durante toda sua carreira.

Ou seja, nenhuma paciente desse cirurgião ficará curada – a cura já foi comprovada pela ciência – e muitas correrão o risco de serem mutiladas perdendo seus órgãos reprodutores, pois esse cirurgião acredita que a doença é causada pelo útero.

Os resultados de um cirurgião falam apenas por ele próprio e não por todos. Um cirurgião que não faz excisão e que não conhece todas as manifestações da doença e não as reconhece durante a cirurgia, nunca terá um resultado positivo de cura.

Porém, há cientistas trabalhando há décadas para mudar essa visão e salvar vidas das endomulheres. E o doutor David Redwine é o grande líder e nome da ciência moderna quando falamos em desvendar a endometriose sob a ótica da ciência baseada em evidências. 

O ‘velho discurso’ de que a endometriose vem da menstruação e não tem cura não condiz mais com os achados científicos da atualidade e precisa ser mudado. E isso já está acontecendo.

Quem lê nossos textos, especialmente, nossas traduções não aceita mais o discurso retrógrado e atrasado da endometriose e mutilações desnecessárias. Agora, vou deixar para o doutor Redwine continuar desvendando Sampson e sua fadada teoria. Beijo carinhoso! Caroline Salazar 

Por doutor David Redwine
Tradução: Alexandre Vaz
Edição: doutor Alysson Zanatta

Os problemas com a teoria de Sampson – É uma teoria ou uma desculpa?

O conceito de fixação inicial poderia ser visto como o “Santo Graal” da endometriose. Encontrem-no e poderão provar a teoria de Sampson e convencer os céticos como eu de que ela é verdadeira. Mas deveria ter sido encontrado faz muito tempo já.

Aqueles que estudaram endometriose microscópica não encontraram provas de fixação inicial. Existem apenas duas razões possíveis para a continuada falta de provas de fixação inicial:

1. Aqueles que preferem a teoria de Sampson não buscaram as provas;

2. A fixação inicial não ocorre porque a teoria de Sampson está errada.

A teoria de Sampson leva a um sentimento de desesperança tanto entre as portadoras como entre os médicos. Mas isso é acerca de algo mais do que incerteza científica relacionada com a origem da doença.

Esse sentimento de futilidade pode ter um impacto direto no tratamento cirúrgico da doença.

Se o cirurgião está convencido de que a doença simplesmente “vai voltar” após a cirurgia, ele ou ela poderá não ser tão minucioso na remoção dos focos, e isso resultará em reincidência da doença, cumprindo assim automaticamente a profecia de que “a endometriose sempre volta”.

Se um cirurgião queima apenas a superfície da endometriose com laser (cauterização) ou eletrocoagulação, e acaba pensando que toda a doença foi destruída, a doença persistente poderá arcar com as culpas na forma de “recorrente” devido à teoria de Sampson.

Terapia medicamentosa poderá ser influenciada de forma semelhante. Embora ninguém tenha se dado ao trabalho de fazer um estudo provando que a gravidez ou a menopausa erradicam a endometriose, toda a terapia medicamentosa é baseada em repetir os supostos benefícios desses dois estados hormonais.

Sabemos que a terapia medicamentosa não erradica a doença, mas se o médico acredita que sim, então, a “recorrência” pode novamente ser a culpada de acordo com a teoria de Sampson. Será que dá pra ser mais perfeito do que isso?

Tendo a teoria de Sampson como base, a falha nas terapias medicamentosas ou cirúrgicas nunca são devidas a ineficácia do remédio ou do cirurgião, pois a pelve recebe nova carga da doença no próximo mês e nos meses seguintes. Não é uma falha do sistema, é a natureza da doença.

Os médicos não precisam buscar outras respostas sobre seus métodos de tratamento, já que a falha está explicada e prevista, e não é culpa deles. No meu ponto de vista, a teoria de Sampson é na verdade a desculpa de Sampson na nossa era.

Com toda essa conversa, eu não estou culpando John Sampson por nada, e não quero que as pessoas pensem que eu o estou desrespeitando.

Ele foi um excelente estudante de endometriose, e fez o melhor que conseguiu ao desenvolver essa teoria de origem com os fatos que tinha disponíveis na época. Se ele soubesse o que sabemos hoje, estou certo de que não teria apresentado a mesma teoria.

O problema está na capacidade humana de aceitar coisas do passado sem as questionar, e isso continua sendo um problema nos dias de hoje. Precisamos de mais gente questionando de forma saudável a autoridade.

Nota do Revisor: aceitar a teoria da menstruação retrógrada como explicação da origem da endometriose é “fácil”. Como dito pelo doutor Redwine, justifica, antecipadamente, todas as falhas medicamentosas e cirúrgicas.

Sampson foi um grande pesquisador de sua época. Brilhante, reservado, dedicou sua vida ao estudo da endometriose. Levava desenhistas às salas de cirurgia para reproduzirem o que visualizada nas cirurgias de endometriose.

E propôs a teoria da menstruação retrógrada com o melhor do seu conhecimento naquele momento. Mudamos. Desenvolvemos novas e potentes ferramentas de pesquisa.

Avançamos em muitas áreas da medicina, como anestesia, antibioticoterapia, imunizações. Mas ainda não tivemos avanços reais no entendimento da origem da endometriose.

Nesta área, avançamos no diagnóstico por imagem e nas cirurgias. Mas não temos avanços em tratamento medicamentoso e na prevenção. Pelo simples fato que a menstruação retrógrada não explica a endometriose.

A notícia positiva é que o avanço no diagnóstico por imagem fará com que a doença seja melhor identificada, possibilitando diagnóstico mais precoce e melhor avaliação dos tratamentos realizados.

A realidade irá se impor gradualmente, e a teoria da menstruação retrógrada poderá ser finalmente abandonada, em prol de avanços reais no tratamento da doença. Forte abraço, Alysson.

Imagem destaque: montagem da imagem do texto original da Endopedia.

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