Por Caroline Salazar
Edição: doutor Alysson Zanatta
No mês de julho, o doutor David Redwine compartilhou em seu perfil numa rede social um estudo sobre um caso raro de endometriose na ponta do dedo indicador direito abaixo do leito ungueal (nota da autora: parte abaixo das unhas) de uma jovem de 18 anos.
Ele começou o texto falando sobre a origem da endometriose. “Você sabia que a camada da unha é de origem mesodérmica?
A Mülleriose ou Mulleriana é a expressão anormal dos genes mullerianos (ginecológicos), resultando em depósitos de mesoderma defeituosa em todo corpo”, explicou o cientista americano.
Em 1987, Redwine já havia mencionado essa informação em seu artigo sobre a Teoria Mülleriana, também conhecida como Embrionária, no qual descrevia que a origem da endometriose tinha que ser algo simples, que pudesse explicar como o embrião pode ser afetado em locais de alguma forma predeterminados.
A jovem em questão teve sua primeira menstruação aos 13 anos, seus ciclos eram regulares com duração do fluxo de 4 a 5 dias, e não havia iniciado vida sexual. Ela não teve nenhuma outra doença anterior e tampouco intervenção cirúrgica.
O exame clínico da paciente não revelou nenhuma outra alteração. Seu abdômen era macio, não apresentou sensibilidade e não tinha massa palpável ou fluido.
O exame retal também foi realizado e o resultado foi normal, assim como o do sistema respiratório, cardiovascular e nervoso central.
A única alteração que essa paciente tinha era uma lesão de 1 cm² com coloração avermelhada e leve inchaço abaixo do leito ungueal.
Por falta de recursos financeiros a paciente não realizou ressonância magnética, mas fez a biópsia do local do sangramento, e foi confirmada que as características histológicas eram glândulas e estromas endometriais compatíveis com endometriose.
Após a confirmação de endometriose extrapélvica no dedo desta paciente e que ela não tinha foco em nenhum outro local, ela foi submetida à cirurgia por excisão, com a remoção de todo o foco, tendo seus sintomas e a doença erradicada.
Nas mulheres com endometriose extrapélvica é importante a avaliação completa para saber se não há foco na pelve ou em outro local, pois cerca de 50% das mulheres com esse tipo de endometriose apresentam lesões em outros locais.
Este é considerado um caso raro de endometriose extrapélvica, que, segundo o estudo dos cientistas Jena Saubhagya Kumar, Mishra Lipsa, Behera Satyanarayan e Samal Soumya, representa 15% de manifestação da doença.
Também já foi relatado na literatura científica a presença da doença nos pulmões, na pleura, na mucosa nasal, nos gânglios linfáticos, no omento ou epiploon, no umbigo e na superfície inferior do diafragma.
Os locais mais comuns de endometriose extrapélvica são: cicatrizes cirúrgicas abdominais, (como cesárea e histerectomia), além de feridas de episiotomia.
Nervo ciático, envolvimento muscular dos glúteos, adutores e reto abdominal também são locais considerados “raros” que já foram descritos na literatura científica.
Eu, particularmente, tenho visto muitos casos de endometriose umbilical, inclusive, em meninas jovens sem nenhuma cirurgia prévia, e no nervo ciático. Com tantos casos eu não considero esses locais tão raros.
Mas é a primeira vez que vejo um caso raro de endometriose como esse: no dedo indicador. Eu também já fiquei sabendo de mulheres que estão internadas em manicômio que chegaram lá como loucas, mas após ressonância o resultado foi: endometriose no cérebro.
Penso que já passou da hora dos “verdadeiros cientistas” chegarem num consenso para validar a principal causa da endometriose. Não podemos continuar acreditando no velho conto da carochinha, pois são milhares de vidas que estão sofrendo.
O doutor Alysson Zanatta já falou em artigos anteriores que um médico só sabe tratar uma doença se ele souber a origem dela. E é isso que temos visto na endometriose: só sabe tratá-la definitivamente o cirurgião que vê a doença além da menstruação retrógrada.
Afinal, como um refluxo menstrual vai parar no cérebro, nos olhos, na ponta do dedo, no pulmão, na pleura e tantos órgãos distantes da pelve, como já foram relatados pela ciência?
É preciso rever urgentemente tudo que não vem funcionando em relação à endometriose há décadas, bem como o que alguns cientistas e cirurgiões, como o doutor Redwine, estão fazendo também há décadas e resolvendo o problema de milhares de endomulheres.
Há cerca de 40 anos, ele fala sobre a teoria embrionária como causa da endometriose e da existência de cura, o que a cada dia está se comprovando nas várias manifestações da doença.
Não podemos continuar cegos(as) e deixar que futuras gerações sofram, como nós sofremos, por conta da desinformação.
Nota do editor: A ciência se vale de modelos experimentais (animais) e humanos para estudo das doenças. Por exemplo, o estudo gêmeos monozigóticos (idênticos) pode trazer importantes informações para doenças genéticas.
No caso da endometriose, nenhum modelo animal conseguiu reproduzir a doença profunda através da inoculação de células endometriais (talvez porque simplesmente a doença não seja causada por menstruação).
Assim, a ocorrência de endometriose externamente visível, como neste caso de endometriose em dedo indicador, representa uma excelente oportunidade de estudo.
Trata-se do primeiro caso de endometriose descrito nesta localização. A doença ocorreu abaixo da pele, no leito da unha, local que se origina de uma grande “matriz” de tecido embrionário chamada de mesoderma.
Da mesma forma, as lesões características de endometriose também ocorrem em tecidos derivados do mesoderma. Assim, este caso corroboraria a hipótese de que a endometriose tenha uma origem embrionária ou mesodérmica.
Seria de se perguntar se, neste caso, a endometriose não poderia ter sido causada por contato direto do dedo indicador com sangue menstrual, talvez por automanipulação.
O relato não traz menção a este fato. Entretanto, fosse este um fato possível, observaríamos mais casos de endometriose em dedos ao redor do mundo.
Discutir (e rediscutir e rediscutir ainda mais) a causa da endometriose é fundamental para avançarmos em seu tratamento. E, a meu ver, quanto menos acreditarmos na menstruação retrógrada, mais avançaremos.
Fonte estudo e imagens texto e destaque: National Center for Biotechnology Information