Já falamos sobre a adenomiose algumas vezes na coluna “Com a Palavra, o Especialista“, e já abordamos também aqui na coluna do doutor David Redwine o que é, os sintomas, o diagnóstico e como é o tratamento.
Porém este é um tema que ainda gera muitas dúvidas nas portadoras de endometriose. Por isso, no texto de hoje vamos muito além das questões básicas.
O texto, em formato de perguntas e respostas, explica muito além dos sintomas, as causas e o tratamento. Nele vamos abordar a diferença entre adenomiose e endometriose, o que causa a adenomiose, se as adolescentes também podem ter a doença e se a adenomiose compromete a infertilidade estão entre as perguntas do texto.
O médico e cientista americano irá sanar todas as suas dúvidas sobre adenomiose. Ele também fala sobre os análogos e se algum medicamento erradica a adenomiose.
Mais um texto exclusivo do A Endometriose e Eu que vai te ajudar a esclarecer ainda mais sobre adenomiose e endometriose. Beijo carinhoso! Caroline Salazar
Entrevista em inglês: Libby Hopton
Tradução: doutor Alysson Zanatta
Edição: Caroline Salazar
Tudo que você precisa saber sobre a adenomiose
A adenomiose é normalmente considerada uma doença cujo início dos sintomas ocorre mais tardiamente do que a endometriose, e que acomete tipicamente mulheres acima dos 30 anos de idade, especialmente aquelas que já engravidaram.
Libby Hopton: O que é adenomiose?
David Redwine: Adenomiose refere-se ao tecido glandular presente no músculo uterino, onde ele não deveria existir. O tecido glandular assemelha-se ao tecido glandular que reveste o endométrio (a cavidade uterina).
Nós não sabemos o que essas glândulas secretam, mas presumivelmente as secreções são irritativas da mesma maneira que as secreções glandulares da endometriose o são.
A adenomiose pode ser difusa, como cupins em uma parede, ou pode ser encontrada na forma de um nódulo delimitado chamado adenomioma. Esse é demonstrado na fotomicrografia anexa. Em latim, o plural de adenomioma é adenomiomata.
Figura 1. Adenomiose difusa na parede posterior do útero.
LH: Quais são os sintomas da adenomiose?
DR: Como a adenomiose é uma doença que envolve a parede muscular do útero, os principais sintomas da adenomiose são cólicas uterinas, especialmente durante o ciclo menstrual. Algumas mulheres com adenomiose podem ter cólicas ao longo de todo o mês, apesar de ainda agravadas durante a menstruação.
Quando o útero dói, a dor pode irradiar-se para a região lombar baixa, para a parte baixa da barriga, e abaixo na região frontal das pernas. Durante o exame ginecológico, o útero pode estar doloroso ao toque, especialmente quando os sintomas da adenomiose são severos.
Se a palpação do útero reproduzir de alguma maneira a dor que a mulher sente, isso então apontará um dedo em direção ao útero como o causador de pelo menos parte da dor, e a adenomiose será a principal candidata.
Como o útero é tocado durante a relação sexual, algumas mulheres com adenomiose podem ter relações sexuais dolorosas. Um útero doloroso também modifica-se com o enchimento ou esvaziamento da bexiga ou do reto, e portanto, a micção e a evacuação dolorosas também poderão ser sintomas da adenomiose.
Assim, a adenomiose tem vários sintomas em comum com a endometriose, e isso pode causar confusão no diagnóstico. Uma das características que difere a adenomiose da endometriose é que a adenomiose pode eventualmente causar fluxos menstruais intensos ou irregulares. Já a endometriose raramente causará desarranjos no ciclo menstrual.
LH: Por que você acha que o início dos sintomas da adenomiose se dá mais tardiamente do que a endometriose, e isso é o que sempre ocorre?
DR: Como a cólica uterina é o sintoma clássico da adenomiose, e como muitas mulheres com endometriose podem ter cólicas durante o fluxo menstrual mesmo no início da adolescência, há uma sobreposição deste sintoma da adenomiose com a endometriose que pode tornar difícil saber quando exatamente a adenomiose começou a se desenvolver.
Por outro lado, está claro que a endometriose pode ser diagnosticada pela laparoscopia no início da adolescência (ou mesmo nos fetos, de acordo com os trabalhos de Signorile), enquanto o diagnóstico da adenomiose por ressonância magnética (a maneira mais precoce de se diagnosticar a doença sem a realização de histerectomia) seria incomum antes dos 20 anos de idade e mais comum após essa idade.
Portanto há alguma evidência que a adenomiose manifesta-se mais tardiamente que a endometriose, mas isso não seria simplesmente porque a adenomiose mais precoce (e portanto menor) não poderia ser vista aos exames porque ela é muito pequena?
Apesar da adenomiose costumar ser diagnosticada mais tardiamente do que a endometriose ao longo da vida, isso não significa necessariamente que ela tenha se iniciado após a endometriose.
Como a adenomiose geralmente necessita da realização de histerectomia para seu diagnóstico, significa que o diagnóstico será comumente retardado por dois motivos:
1. até que a mulher tenha todos os filhos desejados;
2. após todas as medidas médicas ou cirúrgicas conservadoras terem se esgotado. E como os sintomas da adenomiose são de alguma forma parecidos com os da endometriose, não seriam alguns dos sintomas da adenomiose sub-diagnosticados pela sobreposição dos sintomas da endometriose, a qual chama mais a atenção porque é mais fácil de se diagnosticar?
LH: A adenomiose deveria ser considerada como possível causa de dor em pacientes jovens que tenham dor uterina, incluindo as adolescentes?
DR: Sim, apesar de haver pouco a se fazer, porque as adolescentes geralmente ainda não engravidaram e também não tentaram outras formas de tratamento conservador.
LH: Você acha que a associação entre adenomiose com gravidez pregressa e idade mais tardia de início dos sintomas é correta, ou função de um viés de seleção (isto é, mulheres que são mais velhas e que completaram suas famílias são mais propensas a optarem pela histerectomia e receberem portanto o diagnóstico confirmado por biópsia)?
DR: Eu acredito no viés de seleção. Uma coisa que aprendi durante a faculdade de Medicina e na especialização era que a adenomiose seria mais comum em mulheres que já tiveram filhos, mas como o diagnóstico necessita de histerectomia, isso concentraria o diagnóstico em faixas etárias mais avançadas.
LH: O que causa a adenomiose em sua opinião? A adenomiose tem origem embrionária ou poderia também ser plausivelmente uma condição adquirida, como naqueles casos de sintomas que surgem após uma gestação?
DR: Eu acho que a adenomiose tem origem embrionária, assim como a endometriose também parece ser embrionária.
De fato, a teoria da Mülleriose, o melhor modelo para explicar a origem da adenomiose, é na verdade um conceito antigo que pode incluir a adenomiose como uma prima da endometriose (leia o texto: Mulleriose: A melhor teoriapara a origem da endometriose).
LH: Você acha que o tipo de tecido do local da doença (músculo uterino) pode ter algo a ver com o surgimento mais tardio das dores em comparação à endometriose?
DR: Essa é uma boa pergunta. A endometriose começa no peritônio, que é muito fino e tem uma grande inervação. A adenomiose começa no músculo uterino próximo ao endométrio, o revestimento uterino.
O músculo uterino é mais grosso, mas também tem fibras nervosas. Portanto, poderia supor-se que uma doença glandular secretora de substâncias irritativas sobre o peritônio como a endometriose poderia causar dores mais precocemente do que pequenas glândulas que se formam na parede muscular do útero.
Mas aí nós retornamos às primeiras questões acima – não se iniciaria a adenomiose no mesmo momento que a endometriose, causando sintomas similares, mas que seria mais difícil de se diagnosticar e causar a impressão de ter se iniciado mais tardiamente?
LH: A adenomiose também comprometeria a fertilidade?
DR: A adenomiose foi relacionada à infertilidade em macacos, portanto ela também pode comprometer a fertilidade em humanos. Algumas mulheres com adenomiose e infertilidade podem gestar após a remoção de parte de sua adenomiose.
LH: Hormônios ou a histerectomia são normalmente oferecidos como formas de tratamento da adenomiose. Obviamente, nem todas as mulheres com sintomas incapacitantes estarão preparadas para a remoção cirúrgica do útero, e os tratamentos hormonais não são bem tolerados por muitas, além de não ser uma opção para aquelas que estiverem tentando engravidar. Há alguma outra opção cirúrgica possível para o tratamento da adenomiose sintomática?
DR: Há vários procedimentos conservadores que podem ser realizados em um esforço para se manter o útero e para reduzir a dor da adenomiose. Um adenomioma isolado pode ser removido cirurgicamente, da mesma forma que um mioma.
A principal diferença na remoção de um adenomioma comparado ao mioma é que este destaca-se do útero facilmente, como uma pérola retirada de uma gelatina. O adenomioma não é tão bem delimitado e pode invadir o músculo adjacente e, portanto, fica mais difícil removê-lo porque as fibras musculares tendem a se misturar com aquelas do tecido adjacente.
Um problema na remoção do adenomioma é que frequentemente pode haver mais adenomiose difusa presente em outros locais do útero, e a doença remanescente poderá continuar a causar sintomas.
Para superar esse problema, Osada desenvolveu um procedimento para a remoção de mais tecido muscular do útero. Isso é feito por laparotomia, e mais informações sobre o procedimento, incluindo vídeos cirúrgicos e depoimentos de pacientes, podem ser vistos em www.infertile.com.
Um outro procedimento que pode beneficiar as pacientes de alguma forma é a neurectomia pré-sacral (NPS) na qual são cortados os nervos que carregam as sensações de cólicas uterinas. Esse é um procedimento simples que pode ser feito por laparoscopia.
Apesar de sua eficácia ter sido demonstrada em um estudo clínico randomizado, ele funciona menos em mulheres que têm a adenomiose como causa de sua dor uterina. O motivo pelo qual se sabe isso é que se a NPS não tiver sucesso em aliviar as dores uterinas, e se a paciente passar depois por uma histerectomia, haverá uma alta prevalência de adenomiose ao estudo microscópico do útero.
Um dos motivos pelo qual a NPS pode falhar é que o útero acometido pela adenomiose pode estar também secretando substâncias químicas inflamatórias. Essas substâncias podem irritar as cavidades pélvica e abdominal, resultando em sintomas semelhantes à síndrome do intestino irritável (SII), assim como serem levadas a todo o corpo e causarem sintomas como fadiga, febre de baixo grau, e dores musculares e nas articulações.
LH: Quão relacionadas estão a adenomiose e a endometriose? Qual a frequência que elas ocorrem simultaneamente nesses estudos? Existe uma relação direta entre adenomiose e endometriose invasiva?
DR: Ambas adenomiose e endometriose são relacionadas a diferenciação e migração aberrantes dos ductos de Müller. Os ductos de Müller são o substrato fetal dos órgãos genitais internos femininos.
Um problema na diferenciação e migração dos ductos de Müller durante a formação embrionária poderia ser a causa de ambas as doenças. É difícil saber qual a frequência de associação das doenças porque a maioria das mulheres que eu operei não desejavam a histerectomia, portanto eu não tinha nenhuma maneira de saber a real incidência da adenomiose em mulheres com endometriose.
Em mulheres que não responderam à cirurgia conservadora (nota do tradutor: sem a remoção do útero) e nas quais eventualmente se realiza uma histerectomia, a adenomiose possivelmente está presente em mais de 50% dos casos. Pode haver uma relação entre endometriose e adenomiose avançadas, porque eu encontrei uma associação de ambas muito frequentemente.
De fato, a endometriose profunda invasiva costumava ser chamada de adenomioma porque a endometriose invasiva assemelha-se à adenomiose quando avaliada ao microscópio.
LH: A adenomiose e a endometriose são essencialmente a mesma condição apenas com localizações diferentes, ou elas também são histológica e morfologicamente diferentes?
DR: Essa pergunta é certamente Zen. Eu acho que elas são tão fortemente relacionadas que poderiam ser consideradas idênticas, exceto quanto à localização. Isso é especialmente evidente quando se considera a endometriose invasiva e a adenomiose.
A endometriose invasiva e a adenomiose severa são praticamente idênticas sob o microscópio, e ambas podem ser muito semelhantes quando observadas a olho nu.
LH: Quando uma mulher passa por uma histerectomia devido à suspeita de adenomiose e a sua biópsia pós-operatória é negativa para a doença, qual seria a explicação possível?
DR: Mesmo um útero “normal” pode causar dores por motivos que não compreendemos completamente, situações nas quais todas as biópsias seriam negativas para adenomiose, mesmo que a paciente apresente os sintomas clássicos.
Além disso, se no esforço para se diagnosticar a adenomiose for obtida uma biópsia da parte interna do útero, é possível que a biópsia deixe de diagnosticar a doença escondida em algum outro lugar da parede muscular do útero.
Se houver um crescimento óbvio do útero ou uma descoloração hemorrágica de sua superfície, a biópsia poderá demonstrar adenomiose. Mas em muitos casos de adenomiose, a superfície do útero aparenta normalidade, e a biópsia pode ser muito rasa a ponto de não diagnosticar a doença corretamente.
Quando o útero é removido, o patologista tem uma grande quantidade de tecido para trabalhar. O procedimento normal para o patologista é obter várias amostras de toda a espessura da parede muscular do útero, assim como amostras de nódulos, irregularidades ou áreas de descoloração que sejam óbvias.
Essas áreas são avaliadas com o microscópio na busca de adenomiose. Se o resultado for negativo, o cirurgião pode solicitar ao patologista que avalie mais tecido uterino para estudos microscópicos adicionais. Esses passos reduzem enormemente a possibilidade de que a adenomiose não seja detectada.
LH: As camadas musculares da parede uterina são igualmente suscetíveis ao desenvolvimento da adenomiose, ou a doença tende a se localizar em uma porção específica do músculo? Caso positivo, porque isso aconteceria?
DR: A parede posterior do útero é geralmente mais afetada, portanto a distribuição da adenomiose não é aleatória.
O acometimento da parede posterior do útero seria explicado por problemas na diferenciação e migração dos ductos de Müller em sentido distal na pelve posterior, deixando células de endometriose mais comumente no fundo de saco (nota do tradutor: região atrás do útero, entre o útero e o intestino) e a adenomiose mais comumente na porta ao lado, na face posterior do colo uterino.
Cuthbert Lockyer ilustrou isso em uma publicação há quase um século atrás.
Figura 2. Adenomioma (adenomiose e endometriose invasiva) do espaço reto-vaginal. Visão microscópica de corte sagital.
Este é um desenho de espécime cirúrgico – o útero foi removido juntamente com um segmento do reto (intestino) preso a si. O espécime foi cortado ao meio e representa o que é chamado um corte sagital.
Neste desenho, podemos ver o útero como um órgão branco à esquerda e o reto como uma estrutura oca à direita. Entre o útero e o reto encontra-se uma área de endometriose profunda invasiva que resultou na obliteração completa do fundo de saco.
O reto está acometido por um nódulo, demonstrado como se fosse um tumor branco arredondado. Notem que fibras de tecido estendem-se desde a lesão de endometriose até a face posterior do colo uterino e parede uterina posterior. Isso representa adenomiose na parede uterina posterior.
Notem também que Lockyer estava usando para a lesão o termo du jour – adenomioma – para o qual muitos cirurgiões hoje identificariam como endometriose profunda invasiva.
LH: Qual a diferença entre adenomiose focal (adenomioma) e adenomiose difusa? Qual variação é a mais comum? Essas duas variantes são tratadas da mesma forma?
DR: A adenomiose focal ou adenomioma é menos comum que a adenomiose difusa. Essas duas variações são ilustradas acima. Os adenomiomas focais podem ser removidos cirurgicamente, como discutido previamente.
A adenomiose difusa pode ser removida pelo procedimento de Osada ou por histerectomia. Não há nenhum remédio que possa erradicar a adenomiose, apesar da supressão da produção de estrogênios ser capaz de reduzir os sintomas enquanto a paciente estiver usando medicação.
LH: Por que a adenomiose não é normalmente diagnosticada pela ultrassonografia ou ressonância?
DR: Para que alguma doença apareça nos exames, é necessário que ela tenha ou um volume suficiente ou uma diferença suficiente de densidade em relação ao tecido adjacente. Quanto menor for essa doença, menos provável que seja detectada ao exame de imagem.
Os exames têm dificuldade em detectar lesões menores que 0,5 cm. A densidade de uma doença comparada ao tecido adjacente também é importante. Por exemplo, uma pequena pérola suspensa em gelatina de limão será vista mais facilmente do que gelatina de framboesa suspensa em gelatina de limão.
LH: Os ginecologistas deveriam evitar propor histerectomia para mulheres mais jovens com dor uterina?
DR: Se todos os tratamentos médicos e cirúrgicos conservadores tiverem sido tentados, ou explicados e rejeitados, então na minha opinião não há motivo para evitar a opção de histerectomia para uma mulher de qualquer idade, cuja vida tornou-se miserável devido a supostos sintomas uterinos, sejam esses devidos à adenomiose ou a qualquer outro fator.
A paciente mais jovem na qual realizei uma histerectomia tinha 21 anos de idade. Nos Estados Unidos leis federais proíbem a discriminação baseada em idade.
LH: Em sua opinião e experiência, há coisas do tipo como “muito jovem para realizar uma histerectomia”?
DR: Dizer que alguém é “muito jovem” para realizar uma histerectomia é ser paternalista, além de limitar as opções terapêuticas disponíveis para a paciente, e reduzir a paciente à uma criança. Os médicos não precisam assumir o papel de pais quando tratarem suas pacientes.
A principal função do útero é gestar. Mulheres que tiveram histerectomia, mas que ainda tenham pelo menos um ovário podem doar óvulos para que sejam fertilizados por seu parceiro masculino e a gravidez resultante seja levada em um útero de doadora.
A disponibilidade de técnicas de reprodução assistida abrandou os efeitos da histerectomia, e reduziram, portanto, a preocupação de que uma paciente seja “muito jovem”.
LH: Existe algum papel para uso de análogos de GnRH, como o Lupron, no tratamento da adenomiose sintomática?
DR: O Lupron demonstrou redução dos sintomas da adenomiose e um pouco do tamanho do útero se ele estiver aumentado pela adenomiose.
Quando a medicação é interrompida, o útero pode recuperar o seu tamanho inicial e os sintomas retornarem rapidamente. O análogo pode ser um desperdício de tempo sintomática e muito caro.
LH: Em relação à histerectomia como um tratamento definitivo para a adenomiose, ela teria algum efeito adverso no prazer sexual e na habilidade de ter relações sexuais?
DR: Os estudos mostraram que após a histerectomia as mulheres têm relações sexuais mais frequentemente, com maior prazer, orgasmos mais frequentes, e orgasmos mais prazerosos.
Isso ocorre porque a histerectomia é realizada primariamente com o objetivo de tratamento de sintomas uterinos, como dor e sangramento. Esses sintomas geralmente vinham atrapalhando a paciente por meses ou anos, interferindo com sua vida diária e vida sexual.
Quando a causa do problema é removida, as pacientes melhoram em todos os aspectos. As mulheres podem passar a ter orgasmos múltiplos após a histerectomia. Se, antes da cirurgia, a mulher tinha sensações prazerosas de contrações uterinas junto com os orgasmos, então essa sensação irá embora.
Porém, muitas mulheres relatam contrações uterinas dolorosas com o orgasmo, e então a presença do útero atrapalha essas pacientes. Há muitos outros músculos pélvicos e abdominais, além do útero, envolvidos no orgasmo, assim como a descarga simpática, e portanto, o orgasmo feminino não tem que necessariamente ser centrado no útero.
LH: Há alguma razão para se realizar uma histerectomia subtotal nessas pacientes (não retirar o colo uterino)?
DR: Os estudos têm demonstrado que, qualquer que seja o motivo pelo qual tenha sido realizada uma histerectomia subtotal, ela não tem nenhuma vantagem sobre a histerectomia total (quando todo o útero é retirado, incluindo o colo) em relação ao suporte pélvico ou função sexual feminina.
O colo remanescente pode causar problemas e precisar ser removido no futuro. Eu tive que remover muitos colos uterinos remanescentes ao longo dos anos devido à dor, endometriose persistente, tecido cicatricial, e obstruções intestinais relacionadas a aderências entre o intestino e o colo.
LH: Quais são as possíveis complicações a curto e longo prazo da histerectomia?
DR: Histerectomia refere-se à remoção do útero. Os ovários não são removidos quando é realizada apenas a histerectomia.
Quando a paciente adequada é selecionada para cirurgia de acordo com seus sintomas e recebe o tratamento cirúrgico adequado, não há efeitos adversos a curto ou a longo prazo da histerectomia, a menos que haja alguma complicação cirúrgica.
As complicações cirúrgicas são possíveis em qualquer cirurgia e se encaixam em três categorias: sangramento, infecção, e lesão a outros órgãos. O sangramento faz parte de qualquer cirurgia e os cirurgiões sabem como controlar o sangramento durante a cirurgia.
O sangramento pós-operatório felizmente é raro e pode parar espontaneamente por si só, ou necessitar de reoperação para tratá-lo. Muitos sangramentos pós-operatórios ocorrem no primeiro ou no segundo dia após a cirurgia, apesar que eu tive uma paciente que teve um sangramento significativo duas semanas após uma histerectomia.
A infecção também é rara. As bactérias gostam de locais quentes, escuros e úmidos, e crescem bem no meio do sangue. Eu sempre deixaria um dreno na cavidade após uma histerectomia para que qualquer fluido sanguinolento seja drenado e diminua os riscos de infecção.
A minha taxa de infecção entre pacientes com histerectomia foi menor que 0,5%. Estudos com homens mais velhos portadores de outras doenças demonstraram que o uso de antibióticos pré-operatórios pode reduzir a taxa de infecção para 5%, então o governo federal decidiu que eles dariam mais dinheiro aos hospitais se todos os pacientes de qualquer sexo ou idade recebessem antibióticos antes da cirurgia.
Isso fez com que os hospitais passassem a exigir que todos os pacientes recebessem antibiótico antes da cirurgia, independente da indicação do cirurgião. Uma quarta categoria de possíveis complicações pode ser classificada como a dor que ocorre após o término da cicatrização. Tal dor pode ser devida à cicatriz, ou à presença de uma causa extrauterina, como doenças que afetam o intestino, bexiga, ou tecido musculoesquelético.
LH: Qual a melhor estratégia cirúrgica para a realização de histerectomia por adenomiose com e sem endometriose associada?
DR: A melhor estratégia para a realização de histerectomia em qualquer paciente com sintomas uterinos é fazê-la de maneira a minimizar a dor pós-operatória, o tempo de internação e da recuperação subsequente, além de obter o melhor resultado cosmético da parede abdominal.
Isso significa que a histerectomia laparoscópica é preferível à histerectomia realizada por laparotomia. A histerectomia robótica não oferece vantagens em relação à histerectomia não robótica, apesar de ser mais demorada, necessitar de mais incisões e que são maiores e mais óbvias, e aumentar os custos do procedimento.
Se não houver endometriose e a paciente tiver apenas sintomas uterinos, então a remoção do útero será suficiente. A remoção do útero não faz com a que a endometriose desapareça, pois a endometriose raramente envolve o útero. Portanto, histerectomia não é tratamento para endometriose.
A histerectomia deve ser realizada quando os sintomas uterinos estiverem interferindo na vida da paciente. Se houver endometriose, esta deve sempre ser removida quando a histerectomia for realizada.
Caso contrário, a paciente ficará com uma doença sabidamente causadora de dor pélvica, e poderá necessitar de cirurgia no futuro. Geralmente a remoção dos ovários não é necessária quando for realizada uma histerectomia em mulher com endometriose, e portanto, pode-se evitar a terapia de reposição hormonal para muitas (até que haja redução da função de seus ovários mais tarde na vida).
Nota do tradutor: O doutor David Redwine responde, de maneira clara e de fácil compreensão, as principais dúvidas relacionadas às causas e ao tratamento da adenomiose, mais uma vez “provocado” pela pesquisadora Libby Hopton.
Ele nos esclarece que a adenomiose pode ser causa de dor uterina e sangramento irregular, além de dores durante a relação sexual e dor em baixo ventre. Esses sintomas se assemelham àqueles da endometriose, o que pode dificultar o diagnóstico.
O médico destaca ainda que o tratamento mais efetivo para adenomiose pode ser a histerectomia, exceto nos casos onde há necessidade e desejo de preservação uterina. Interessantemente, o doutor Redwine desmistifica o conceito que uma mulher possa ser “muito jovem” para optar por uma histerectomia.
O procedimento deve ser sempre uma opção de tratamento independente da idade da mulher, desde que esta seja esclarecida (e oferecida) sobre todas as opções de tratamento.
Em relação à histerectomia para tratamento da adenomiose, cito a possibilidade de que grande parte das histerectomias pode ser realizada por via vaginal, como opção à via laparoscópica.
Nesse tipo de cirurgia, não há nenhuma punção na parede abdominal (o melhor resultado cosmético entre todas as opções), e o tempo cirúrgico e de recuperação são iguais ou superiores à histerectomia por videolaparoscopia. Os custos hospitalares também são nitidamente inferiores.
Contraindicação formal à histerectomia vaginal é a presença de endometriose. Porém, contraindicações comumente usadas como: (a) cesárea prévia, (b) útero volumoso, ou (c) ausência de parto vaginal prévio não se mostram verdadeiras, e podem ser superadas de acordo com a experiência da equipe cirúrgica.
Fale com seu médico sobre a histerectomia vaginal, caso necessite desta cirurgia.
Texto publicado no blogspot dia 25 de abril de 2016
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