Endometriose – o Mal que não precisa ser oculto!

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Minha ideia de trazer relatos de pais com a endometriose surgiu em agosto de 2018 quando convidei o advogado Conceição José Macedo, pai da Ana Karenina, para falar sobre o apoio incondicional que sempre deu à filha.

Nesse ano, em homenagem ao dia dos Pais, convidei o juiz de Direito Parima Dias Veras para contar o longo caminho que percorreu para o diagnóstico da filha, a advogada Nathália Veras, que teve sua menarca aos 10 anos e diagnóstico aos 23.

No texto, ele descreve seus medos diante do diagnóstico de quando a doença é vista de acordo com os mitos. E também fala do apoio que sempre deu à filha e ressalta a importância do apoio dos pais tanto antes do diagnóstico quanto durante o tratamento.

Parima também alerta aos pais de meninas para nunca subestimarem as queixas de suas filhas para evitar o sofrimento de muitas outras meninas.

Realmente é muito importante esse apoio. O apoio e o carinho da família com certeza fazem toda diferença no tratamento da endometriose. Beijo carinhoso! Caroline Salazar 

Endometriose – o Mal que não precisa ser oculto!

 

Por Parima Dias Veras, juiz de Direito
Edição: Caroline Salazar

A endometriose, em conceituação simples, é uma doença (CID- N80) que se caracteriza pelo crescimento anormal de tecido semelhante ao endométrio, o qual tem a função de revestir apenas a parede interna do útero, fora desse órgão alcançando os ovários, intestino, bexiga, reto, podendo atingir outros órgãos.

A doença causa dor, desconforto e por isso mesmo intenso sofrimento. Manifesta-se, normalmente, nas primeiras menstruações, é de difícil diagnóstico por ser facilmente confundida com simples cólicas menstruais.

Estudos revelam que o diagnóstico leva de 7 a 12 anos, em média, para ser realizado, prolongando muito o drama das mulheres que sofrem dessa enfermidade.

Tenho uma filha, Nathália, que tem endometriose, começou a sentir os sintomas por volta dos 10 anos, coincidindo as dores com as primeiras menstruações.

Por serem as dores muito intensas foi levada ao médico pediatra, que a diagnosticou com as chamadas “dores do crescimento”, afirmando que, nesse período da vida, eram normais e logo passariam.

Todavia, as referidas dores persistiram e foram diagnosticadas por outros médicos como cólicas menstruais e assim foram tratadas por muitos anos, mas logicamente sem resolver o problema, persistindo as dores e o sofrimento por longo período.

Como pai experimentei sentimentos de angústia, apreensão e impotência por presenciar o sofrimento da minha filha, com dores e cólicas intensas, infecções urinárias recorrentes e até com certa dificuldade de andar, e pouco poder fazer por falta de um norte, um caminho para buscar uma solução definitiva.

Pai e filha na formatura do ensino médio de Nathália que, aos 15 anos, já sofria com alguns sintomas da endometriose.

Minha filha cresceu e com perseverança nunca deixou de procurar o diagnóstico que solucionasse suas dores, quando finalmente foi diagnosticada com endometriose e indicação cirúrgica.

Inicialmente, o diagnóstico veio acompanhado com indicação de retirada dos ovários, o que deu origem a novos medos e angústias, pois ela sempre acalentou o sonho de ser mãe.

Felizmente a cirurgia foi realizada com a preservação dos ovários, preservando-se também o sonho da maternidade, comum a quase todas as mulheres.

Receber o diagnóstico de endometriose para um pai ou mãe gera um misto de alívio, apreensão e angustia. Alívio porque o diagnóstico correto é o primeiro passo para a cura, para a solução definitiva.

Quanto aos outros sentimentos, devido ao grau da doença, o que determina sua gravidade, a indicação, no caso da minha filha, foi intervenção cirúrgica, que por si só encerra enorme risco, seja à vida, seja à integridade física, especialmente quanto à capacidade de ter filhos.

Nesse último aspecto pensamos na possibilidade de recorrer à técnica de congelamento de óvulos, com o fim de manter a possibilidade e a esperança dela realizar seu sonho de ser mãe, mas, com a graça de Deus, não foi necessário.

Com o diagnóstico e com a cirurgia veio também a informação de que a doença não teria cura e que minha filha poderia ter que passar por procedimentos cirúrgicos a cada três anos, o que gerou novos medos e angústias.

Após a primeira cirurgia e já com indicação da segunda, procurando na internet sobre especialistas, Nathália conheceu o blog A Endometriose e Eu e viajou a São Paulo para consulta e constatou realmente a necessidade de nova intervenção.

Porém, já faz mais de 5 anos da segunda cirurgia que removeu quase todos os focos e ela continua sem sintomas, o que é um grande alívio. Contudo, mesmo sem sintomas ela sabe que ficaram alguns focos de endometriose, que não foram retirados para não arriscar a manutenção da fertilidade.

Quanto à cura da doença, eu e minha filha acreditamos na teoria mulleriana e, consequentemente, na possibilidade de cura total desse mal terrível que faz meninas e mulheres adultas experimentarem sofrimento e incompreensão por muito tempo.

A possibilidade de cura é uma esperança e um alento de ver a minha filha feliz, realizada, vivendo plenamente sem medo de dores e sem ser incompreendida por alteração de humor ou por necessitar, por vezes, ausentar-se de atividades como estudo e trabalho.

A dificuldade de se fazer diagnóstico de endometriose é enorme, apesar de uma em cada 10 mulheres apresentarem o problema, no caso particular da minha filha, convém sublinhar, foi obra do acaso, pois mesmo ela tendo todos os sintomas da endometriose: dores incapacitantes, inchaço abdominal e infecções urinárias recorrentes, o diagnóstico só foi dado após uma cirurgia para retirada de um cisto, cuja biópsia provou ser um endometrioma.

Devido à dificuldade de diagnóstico a doença passa ser um mal oculto, disfarçado, mascarado, especialmente em razão das cólicas menstruais presentes na maioria das mulheres, fazendo com que médicos rotineiramente desconsiderem a endometriose, levando um quantitativo enorme de mulheres a experimentarem sofrimentos intensos, físicos e emocionais, que se estendem do início da puberdade até a idade adulta.

Mas não precisa ser assim! Não precisa ser um mal oculto! A doença grita, se manifesta em dores incapacitante e progressivas em 80% das mulheres. É preciso que se estude mais a doença e se preste mais atenção nessas meninas e mulheres para que o diagnóstico seja precoce.

Por fim, como pai devo dizer que o apoio da família, com amor e compreensão, é fundamental para as pessoas que sofrem de endometriose.

É preciso não se convencer com diagnósticos simplistas, que não levam à solução do sofrimento, é necessário não duvidar da criança ou mulher adulta que apresenta queixas de dores intensas e outros sintomas da endometriose.

É preciso investigar, buscar incessantemente o diagnóstico correto, sem acomodação, com profissionais especializados, até a solução definitiva, ou seja, a cessação das dores e dos demais sintomas da doença, para que a pessoa possa desfrutar de sua vida com qualidade e poder realizar seus sonhos e ser feliz.

Fotos: Arquivo Pessoal/ Nathália Veras

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