Como a endometriose me fez recomeçar minha vida profissional?

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Por Caroline Salazar
Edição: Nathália Veras

Todos os dias ao acordar temos a oportunidade de recomeçar. Porém, este ato torna-se ainda mais evidente em todo começo de ano. No final do ano temos a oportunidade de rever nossas ações e tudo que nos aconteceu para no próximo mudar aquilo que não foi bem ou que queremos melhorar.

Desde 2018, o primeiro texto do ano do blog A Endometriose e Eu tem sido sobre este recomeço. Em 2018 falei sobre o recomeço de uma leitora querida que, após sua tão sonhada cirurgia de excisão, foi surpreendida pelo término de seu noivado.

Dois anos depois, ela está maravilhosamente bem, morou fora, retornou ao Brasil e está plena e feliz. Em 2019 abordei outro recomeço meu. Em 2020, ano que o blog completa 10 anos, quero falar sobre meu recomeço profissional após uma demissão que me levou à depressão profunda.

Era dezembro de 2009 quando pedi à minha editora 3 horas por semana – uma hora por dia – para terminar meu tratamento de fisioterapia no ambulatório público no qual comecei meu tratamento. Propus nesses dias não almoçar e usar meu horário de almoço para fazer as sessões extras. Eu não estava pedindo dispensa de horas, mas apenas para trocar.

Eu trabalhava num site de celebridades e repórter nunca tem horário certo para sair. Eu não batia ponto e nunca em minha vida profissional cumpri apenas a carga horária. Sempre fazia muito mais tempo nas redações.

Com a demora da resposta, uma amiga, também repórter que trabalhava comigo, sugeriu que eu falasse com a editora, pois o ano estava acabando e a data das sessões estavam se aproximando.

Ainda esperei mais uns dois dias e, quando fui falar com ela, adivinha qual foi a resposta? Demissão. Disse que a empresa estava com cortes e que eu precisava cuidar da minha saúde. Como eu não ganhava nem o primeiro, nem o segundo e nem o terceiro salário mais alto da empresa, óbvio que não acreditei na demissão por corte.

Confesso que fiquei sem reação. Eu jamais imaginei que isso poderia acontecer. Eu, que já estava em depressão, entrei em depressão profunda. Tudo que eu sempre quis na vida era ter minha carreira profissional reconhecida e estabilizada.

Vi meu sonho desmoronar. Onde eu ia arrumar outro trabalho estando doente? Eu já estava em tratamento da dispareunia e não podia parar, pois eu estava muito debilitada e não tinha condições de pagar as sessões particulares.

Enviei milhões de currículos, ia nas entrevistas, mas na hora que eu falava do meu tratamento sentia que havia preconceito. Resolvi enviar currículos para outra área do jornalismo que eu também tinha experiência, a assessoria de imprensa, mas eu também encontrei as mesmas dificuldades, o mesmo preconceito.

Eu já estava literalmente pirando quando meu namorado da época sugeriu que eu escrevesse um blog. Mesmo sendo jornalista eu era super leiga nessas tecnologias e demorei uns 3 meses até aceitar a ideia. Pedi ajuda a uma amiga para o nome e pronto!

Em abril de 2010 surgiu o blog A Endometriose e Eu no blogspot como meu diário virtual. No começo quase não escrevia, estava em depressão profunda e não tinha vontade de fazer nada. Quanto mais escrever, que precisa de muita concentração e cabeça tranquila.

Após muitas orações e compreensão de que tudo fazia parte da missão dada por Deus, comecei a relatar tudo que eu passava, sentia e meu tratamento, como minhas consultas médicas, exames, cirurgias.

Aceitei a missão e a doença com resiliência, mas não com conformismo. Sabia que tinha que correr atrás do meu tratamento e por meio do meio relato ajudar outras mulheres a conseguir os seus.

Ainda em 2010 comecei a traduzir artigos científicos internacionais, pesquisas e a reivindicar março como mês de conscientização da doença no Brasil e, um ano depois, já falava de ter o dia e a semana nacional no mês de março, bem como o diagnóstico precoce e o reconhecimento da endometriose como doença social.

Não imaginei que levaria 9 anos até encontrar uma deputada para encabeçar o projeto do Dia e Semana de Luta contra a Endometriose no mês de março. Leia a matéria sobre nosso PL 3047/2019 de autoria da deputada Daniela do Waguinho.

Não foi fácil, principalmente, neste começo que eu estava sozinha. Sozinha porque ainda não tinha minha equipe. Eu tive um apoio muito importante nesta época que nunca me deixou desistir.

Mesmo quando eu pensava em desistir. E confesso que foram várias vezes. Se não fosse o apoio do nosso endomarido, Alexandre, talvez eu não estaria aqui hoje. Sei que sempre em primeiro lugar está Deus – aquele que nunca nos desampara -, nosso Anjo da Guarda, os espíritos amigos, mas como a gente não vê parece que estamos só.

Então, esse apoio “físico, mas distante”, quem vinha do outro lado do oceano foi muito importante e de grande incentivo e era quem me lembrava diariamente que eu precisava começar esta missão.

É impossível não me emocionar ao fazer esta retrospectiva para escrever este texto. Lágrimas caem dos meus olhos e não só pelo que eu passei, mas porque sei que muitas endomulheres estão passando por isso e talvez não tenha ninguém para segurar a sua mão.

Eu queria ter milhões de mãos para segurar e acalentar todas vocês neste exato momento. Saiba que você precisa seguir em frente como eu segui, sua vitória está próxima.

Em 2011, após minha 1ª cirurgia, voltei a frilar como repórter num outro site, depois trabalhei na redação de uma revisa espanhola e saí quando a revista fechou no fim de 2011. Foi triste porque foi a redação mais incrível que já trabalhei. Foi lá que conheci minha querida designer, Mônica, responsável pela arte do blog e da EndoMarcha Time Brasil.

Nesta época os veículos de comunicação enfrentavam uma crise e muitas revistas estavam fechando. Em 2012 fui trabalhar numa assessoria de moda e mantinha o blog em paralelo. Trabalhava das 10h às 19h fora e das 22h às 04h da manhã no blog.

Era uma jornada cansativa que me permitia 4 horas de sono e durou pouco mais de um ano até eu decidir me dedicar exclusivamente ao blog. Nesta época eu ainda não tinha nenhum anúncio no blog. Nos primeiros 5 anos, meu trabalho no blog foi 100% social.

Conheci pessoas, profissionais, inclusive, o próprio Redwine quando esteve no Brasil em 2014. Certamente se tivesse trabalhando em outro lugar teria perdido esta grande oportunidade. Transformei o blog em empresa, comecei a estudar ainda mais sobre a doença e os novos conceitos introduzidos pelo doutor David Rewdine.

A esta altura eu já divulgava os artigos do blog em mais de 50 grupos gringos, o blog já tinha sido citado na novela das 9h da Globo, “Insensato Coração”, em 2011, e eu já estava com um nome forte no mercado internacional.

Tanto que quando pensaram na realização da EndoMarcha no Brasil logo já cogitaram meu nome e o convite foi feito e prontamente aceito.

Hoje, 10 anos depois, agradeço muito a editora do site por ter me mandado embora. Ela não sabe o bem que me fez. Na época eu não tinha o entendimento que tenho hoje sobre os planos de Deus. Não foi fácil

Nós podemos planejar tudo, mas quem dá a última palavra é Deus. Ele sabe de todas as coisas e o que é melhor para cada um de seus filhos. Mesmo que no momento a gente acha que estamos desamparadas, que aquele não é o melhor caminho, siga em frente e não desista.

E após muito sofrimento aprendi também que Ele demora, mas capricha. Deus tem planos maravilhosos para todos os seus filhos e para você que está lendo esta mensagem não será diferente. Nunca imaginei que teria a capacidade de fazer tudo que faço.

Nunca imaginei que seria eu a começar a desvendar esta doença, sob um novo ponto de vista, que comandaria um evento internacional – nunca tinha feito evento na vida -, que daria palestras em audiências públicas, em empresas, que criaria campanhas de conscientização e que orquestraria até projetos de lei.

Eu nunca imaginei que teria toda capacidade que tenho hoje. Nunca imaginei que poderia ser uma empreendedora. Mas Deus sabia que eu tinha toda essa capacidade e muito mais. Afinal, Ele não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos.

Então, se você está passando hoje o que eu passei há 10 anos e precisa de um incentivo como eu precisei, eu seguro a sua mão e te falo: acredite em você, siga em frente e recomece!

Recomece hoje! Todo dia temos esta nova oportunidade de recomeçar.

Que o seu recomeço e o de muitas endomulheres neste novo ano que está se iniciando seja leve, alegre e que você tenha muita saúde, pois ser guerreira para nós portadoras deixou de ser um substantivo e já virou um adjetivo das endomulheres.

Um excelente recomeço a todas as leitoras do A Endometriose e Eu. Beijo carinhoso!

Fonte imagem: Deposit Photos/ Caroline Salazar

1 comentário

  1. janaina batista Em

    Deus abençoe vc sempre!
    Que mesmo na dor , e passando por momentos difíceis vc transformou suas palavras em uma voz que ajudou muito a todas nós endomulhers sou muito fã e agradeço ida por seus esclarecimento sobre essa doença um feliz 2020 para vc ❤️💋💋💋